OFICINA – ESTRATÉGIAS EM SAÚDE MENTAL: MANEJO DA AGRESSIVIDADE E VIOLÊNCIA

OFICINA – ESTRATÉGIAS EM SAÚDE MENTAL: MANEJO DA AGRESSIVIDADE E VIOLÊNCIA

No dia 25 de setembro de 2024, o Instituto Fazendo História realizou a décima primeira oficina presencial do Projeto Formação Profissional para o Trabalho com Jovens, com o apoio do FUMCAD (Fundo Municipal da Criança e do Adolescente), no Instituto Pólis. Com o tema "Estratégias em saúde mental: manejo da agressividade e violência", o encontro foi direcionado aos profissionais que atuam nos Serviços de Acolhimento e também a outros atores da Rede Socioassistencial e do Sistema de Garantia de Direitos da Cidade de São Paulo. 

A oficina contou com a participação de Kleber Duarte Barreto, psicólogo e supervisor clínico, que atua como pesquisador e supervisor na área de Acompanhamento Terapêutico (AT) na UNIP, além de coordenar a equipe Prosopon de AT. Desde 2004, ele supervisiona a equipe de AT do CEVAT, do Tribunal de Justiça de São Paulo e é, também, autor do livro “Ética e Técnica no Acompanhamento Terapêutico: andanças com Dom Quixote e Sancho Pança”.

Kleber abre o encontro abordando o quanto é desafiador esse tema do manejo de situações de agressividade e violência junto a adolescentes, que faz parte da rotina daqueles que trabalham nos serviços de acolhimento. Em um primeiro momento, permeado por relatos de experiências de sua prática profissional e pela abertura às questões dos participantes, ele apresentou conceitos básicos para aprofundar o olhar e a reflexão, a partir das ideias dos psicanalistas Donald Winnicott e Gilberto Safra. 

O convidado trouxe a ideia de hospitalidade como uma das condições básicas do ser humano, ligada à experiência de pertencimento, ou seja, temos a necessidade de nos inscrever na subjetividade de alguém, o que vai ganhando complexidade: desde pertencer a um grupo familiar, a uma comunidade, até a uma sociedade e à história da humanidade. Nesse sentido, há casos, quando já se perdeu a esperança de pertencer, em que se usa, como último recurso, a violência. Os comportamentos mais desafiadores de adolescentes, difíceis de suportar porque machucam e despertam ódio, podem se apresentar como formas desesperadas de buscar reconhecimento de que se pertence e está na subjetividade de outra pessoa.

Kleber também indica a agressividade enquanto um aspecto constitutivo do ser humano e que surge a partir da experiência de corporeidade do bebê, no processo de integração da dimensão somática, com a qual se nasce, a uma dimensão psíquica. Aprofundando na teoria de Winnicott, ele discute sobre a experiência de onipotência do bebê e como, à medida que o ambiente vai falhando, o que invariavelmente acontece e é necessário para que ele desenvolva seus recursos psíquicos e mentais, surge a agressividade. É por meio da agressividade que se desenvolve o princípio de realidade: quando tenta-se destruir o outro e o outro sobrevive, o bebê percebe que seu desejo de destrutividade não é tão poderoso assim. O convidado aborda a importância dos adultos sobreviverem a esse ataque e questiona como isso pode se desenrolar no contexto do acolhimento.

Kleber convoca o grupo a pensar como a violência vai ganhando complexidade conforme a criança cresce e tendo efeitos mais drásticos nas relações com o ambiente, despertando naqueles à sua volta sentimentos de raiva e ódio, os quais precisam ter um lugar de reconhecimento pelos profissionais. O ódio das crianças e adolescentes, e também dos adultos, pode se voltar para dentro, atacando o humor, a vitalidade e os vínculos internos, e se constituindo como ressentimento; ou para fora, se direcionando às pessoas de quem mais se gosta e com quem têm experiências de amor: de modo geral, quem mais nos desorganiza, é quem mais amamos. Pode-se viver esse ódio atuando nas relações, ferindo e machucando o outro, ou expressá-lo de outras maneiras, mais simbólicas.

Ele apresenta o serviço de acolhimento enquanto um lugar que deve ofertar experiências de cuidado e convivência às crianças e adolescentes, em um âmbito institucional, reproduzindo situações e relações básicas próprias do funcionamento de uma casa, para que eles se constituam e sigam suas vidas. Estas condições envolvem vivências de conflitos, presença de figuras masculinas e femininas, possibilidades de fantasias de separação e experiências de amor e ódio com uma mesma pessoa, integrando-a na relação. Traz também a relevância de pessoas de referência que sobrevivam, física e psiquicamente, aos ataques de ódio, para que, assim, os adolescentes possam perceber suas histórias de forma mais objetiva, reconhecer que as relações são compostas por coisas boas e ruins, e escolher dentro de possibilidades (não só, repetir). 

O convidado também atenta os profissionais para como a própria experiência de abrigamento é vivida pelos adolescentes como uma violência, que deixa marcas, da mesma forma que é importante reconhecer outras violências que se estabelecem, de modo silencioso, no cotidiano dos serviços e não são compreendidas como tal, tais quais situações de capacitismo, de superproteção e de ausência de limites. Ele aponta como a vivência de rupturas, enfrentamentos e conflitos, que pode envolver gestos de agressividade, é necessária para o amadurecimento do adolescente, e precisa de um ambiente acolhedor e seguro para que seja experienciada. 

Ambiente este no qual, a partir da relação com alguém mais significativo e que tenha sensibilidade para compreender o panorama no qual se deu conflito, o adolescente tenha a possibilidade de acolher em sua subjetividade essa experiência de dor e possa se situar, de maneira mais saudável e simbólica, frente à situação imediata, assim como à sua própria história. Nessa perspectiva, Kleber problematiza o lugar do castigo e da punição como formas de lidar com comportamentos desafiadores, indicando como atuam, muito mais, como tentativas de inibir, do que de transformar. E, como pensar em estratégias de interlocução, de restabelecimento da confiança e de construção de compromissos, nas quais os adolescentes tenham opções de escolha e sejam reconhecidos para além do lugar de desafio, pode ser um caminho muito mais efetivo.

Para ilustrar a ideia da experiência de habitar o coração do outro como transformadora, Kleber apresenta um trecho do documentário “Human”. Na segunda parte do encontro, os participantes se dividiram em grupos para discutir casos do cotidiano nos serviços de acolhimento, envolvendo situações de agressividade e violência com adolescentes, e depois expuseram no grupo maior, com a mediação do convidado.

Confira o vídeo com a oficina completa: clique aqui

OFICINA - RELAÇÕES RACIAIS E O ACOLHIMENTO DE ADOLESCENTES

OFICINA - RELAÇÕES RACIAIS E O ACOLHIMENTO DE ADOLESCENTES

No dia 31 de julho de 2024, o Instituto Fazendo História realizou a décima oficina presencial do Projeto Formação Profissional para o Trabalho com Jovens, com o apoio do FUMCAD (Fundo Municipal da Criança e do Adolescente), no Instituto Pólis. Com o tema "Relações raciais e o acolhimento de adolescentes", o encontro foi direcionado aos profissionais que atuam nos Serviços de Acolhimento e também a outros atores da Rede Socioassistencial e do Sistema de Garantia de Direitos da cidade de São Paulo.

Convidamos Paulo Bueno, psicanalista, psicólogo, mestre e doutor em Psicologia Social. Paulo também colaborou com o Instituto AMMA Psique & Negritude de 2020 a 2021 e é autor de Coisas que o Pedro me ensina: crônicas de uma paternidade.

Paulo iniciou o encontro com os questionamentos: Como pensar as relações raciais na adolescência no contexto do acolhimento institucional? E como podemos desenvolver uma prática em Serviços de Acolhimento que possa ser identificada como antirracista?

Para refletir sobre uma prática antirracista, Paulo convidou todos a pensar sobre o que é o racismo, apresentando os elementos que compõem essa violência.

O racismo pressupõe a presença de três elementos. O primeiro é a construção da diferença. Para se falar de racismo, é necessário considerar a diferença como uma construção histórica. Não se trata apenas de constatação, mas de uma diferença específica em caracteres raciais que ganha propriedades ao longo do tempo. Nesse sentido, a diferença presente na noção de raça é construída, não como uma invenção, mas como uma categorização — por exemplo, entre raças branca, negra, amarela e indígena.

A diferença, por si só, pode produzir discriminação. Quando pensamos em outras formas de diferença que não são necessariamente raciais, encontramos formas discriminatórias — uma separação, critérios de segregação. Porém, nesse primeiro elemento, ainda não se inclui a ideia de negatividade presente no racismo.

Pode haver discriminação positiva; inclusive, pode-se encontrar valor nela, uma vez que o conceito de igualdade tende a nivelar diferenças, o que pode ser problemático. Por isso, no campo das políticas públicas, opta-se por políticas de equidade em vez de políticas de igualdade. Reconhecemos as diferenças e, assim, promovemos uma discriminação positiva que possibilita políticas de equiparação, como a política de cotas raciais.

O segundo elemento que compõe a noção de racismo é a hierarquia. Além de constatar a diferença, há também a sua hierarquização, algo que foi fomentado pelo colonialismo.

O colonialismo, ao inventar as raças, imediatamente hierarquizou entre aqueles que são considerados racionais e aqueles que não seriam dotados dessa capacidade. Os mais próximos de uma civilidade conforme os padrões europeus — ainda que existam outras civilizações com diferentes formatos — são escolhidos como modelo civilizatório, com outras sociedades sendo vistas como primitivas.

A diferença, combinada com a hierarquia, gera não apenas discriminação, mas também preconceito, pois a hierarquização implica uma inferioridade inata, socialmente construída em relação a determinado grupo.

Por fim, o terceiro elemento fundamental para a construção do racismo é o poder. Há uma distribuição desigual nas relações raciais; além da hierarquização, o poder se concentra em um determinado grupo — o grupo branco — em comparação com os demais grupos racializados. Paulo trouxe para a discussão Grada Kilomba, que aponta que o racismo, necessariamente, está relacionado à supremacia branca. Isso se torna claro quando observamos que o poder, os bens materiais e os bens simbólicos estão concentrados nas mãos da branquitude.

Ao incluir o elemento do poder na definição de racismo, entende-se por que não é possível falar em racismo contra si próprio. Não existe racismo contra si próprio, pois a dinâmica de poder fará com que práticas e discursos racistas sejam voltados contra a própria população negra. Paulo exemplificou que, se ele se posicionar contra as cotas raciais, no futuro, as crianças de sua família serão prejudicadas. Nesse sentido, a noção de racismo contra si próprio não se sustenta, pois é necessário considerar o poder nas relações raciais.

Paulo explicou que o conceito de "racismo reverso" é impreciso. Mesmo que ocorram comportamentos hostis de indivíduos negros contra indivíduos brancos com base em raça, essas ações não se enquadram na definição de racismo, pois a dinâmica de poder subjacente permanece inalterada, sendo este um elemento crucial na definição de racismo.

A noção de racismo apresentada por Paulo Bueno se sustenta na diferença, hierarquia e poder, diferenciando as categorias de racismo, preconceito e discriminação, que não são sinônimos. No racismo, há discriminação e preconceito; no preconceito, há discriminação, mas não necessariamente racismo.

Paulo avançou na definição de racismo, diferenciando o racismo estrutural do racismo institucional, que, por sua vez, difere do racismo cotidiano. Na oficina, ele abordou em mais detalhes essas distinções e como o racismo se manifesta nas instituições, assim como os impactos que os jovens negros acolhidos sofrem em seu dia a dia.

Paulo Bueno é psicanalista, psicólogo (PUC-SP), mestre e doutor em Psicologia Social (PUC-SP). Ele também colaborou com o Instituto AMMA Psique & Negritude (2020-2021) e é autor de Coisas que o Pedro me ensina: crônicas de uma paternidade. Além disso, atua como supervisor clínico e institucional, é docente no Instituto Gerar de Psicanálise, pesquisador do Núcleo Psicanálise e Sociedade (PUC-SP) e professor convidado do Programa Fellowship (2021-2022) da Columbia University.

Confira o vídeo com a oficina completa: clique aqui.

PROJETO - Histórias em Movimento

PROJETO - Histórias em Movimento

Apresentação do projeto: Histórias em Movimento para os serviços de acolhimento selecionados

É com muita alegria que o Instituto Fazendo História, em parceria com o Fundo Municipal dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes - FUMCAD, inicia o Projeto Histórias em Movimento.

Foram selecionados 5 serviços de acolhimento nas regiões leste e noroeste da cidade de São Paulo, que irão multiplicar a metodologia de trabalho do Fazendo Minha História, permitindo que crianças e adolescentes em acolhimento compartilhem suas experiências de vida com voluntárias(os), de forma afetiva, a fim de contribuir para a construção e o fortalecimento de suas identidades, valores e ideias.

Os serviços selecionados são:

SAICA São Mateus II

SAICA São Mateus IV

SAICA Caminhando Juntos

SAICA Professora Kalu

SAICA Estrela do Amanhã II

Este projeto é realizado com o apoio do Fundo Municipal dos Direitos da Criança e dos Adolescente - FUMCAD, com o apoio das empresas: Pernambucanas, Stima, Singulare, Velt, Casa Bauducco e Credit Suissse Hedging-Griffo Wealth Management SA.

PLANO ANUAL INSTITUTO FAZENDO HISTÓRIA - SERVIÇOS SELECIONADOS

PLANO ANUAL INSTITUTO FAZENDO HISTÓRIA - SERVIÇOS SELECIONADOS

COM APOIO DO MINISTÉRIO DA CULTURA, O FAZENDO MINHA HISTÓRIA ESTABELECE PARCERIA COM 14 SERVIÇOS DE ACOLHIMENTO PARA CRIANÇAS E ADOLESCENTES NOS MUNICÍPIOS DE MACEIÓ E REGIÃO METROPOLITANA E EM ARACAJU E REGIÃO METROPOLITANA.

É com muita alegria que divulgamos em primeira mão os 14 serviços de acolhimento contemplados pelo projeto "PLANO ANUAL INSTITUTO FAZENDO HISTÓRIA", que contempla serviços de acolhimento dos estados de Alagoas e Sergipe. Abaixo seguem as unidades selecionadas.

1. Abrigo Institucional Luzinete Soares de Almeida (AL)

2. Serviço de Acolhimento Institucional Acolher (AL)

3. Acolhimento Institucional Casa Lar SEMDES (AL)

4. Casa Lar de Rio Largo (AL)

5. Serviço de Acolhimento Institucional Rubens Colaço (AL)

6. Unidade de Acolhimento Para Crianças e Adolescentes de Pilar (AL)

7. Casa Lar Aconchego (AL)

8. Unidade de Acolhimento Sorriso (SE)

9. Unidade de Acolhimento Caçula Barreto (SE)

10. Casa Lar 1 (SE)

11. Casa Lar 2 (SE)

12. Casa Lar 3 (SE)

13. Casa da Criança Nossa Senhora Da Vitória (SE)

14. Unidade de Acolhimento Mista Irmã Valmira (SE)

Construiremos junto com cada um dos serviços de acolhimento parceiros um espaço de leitura com 300 livros infantojuvenis. O projeto ainda prevê seminários e todo o suporte necessário para favorecer o desenvolvimento integral de crianças e adolescentes acolhidos.

Parabéns aos selecionados, estamos muito felizes por fazer história com vocês!

ARTIGO - Telas, bebês e acolhimento

ARTIGO - Telas, bebês e acolhimento

Por Melina Bertholdo e Vitoria Whately

Onde estamos?

Além de necessitar de supervisão em tempo integral, bebês e crianças pequenas solicitam constantemente nossa atenção, afeto e proximidade física. Diante dessas demandas intensas, muitos cuidadores recorrem às telas como forma de distrair as crianças e poder dedicar algum tempo a outras funções, ou mesmo para ter alguns minutos de descanso. Recorrer à chupeta eletrônica é uma estratégia compreensível, além de tremendamente eficaz. E, visto que o mundo ao redor é cada vez mais um mundo de telas, esta fica parecendo a saída natural, ou mesmo a entrada na cultura.

São algumas, a essa altura, as gerações criadas na frente da televisão. Essas pessoas acabam com muita tranquilidade dando continuidade ao tipo de criação que receberam, entendendo que "é assim que se faz". E, com as novas tecnologias e crescente cultura digital, as telas têm aparecido cada vez mais cedo e de maneira mais intensa na vida de bebês e crianças pequenas. De berços com tablets no lugar de móbiles a adultos convictos de que estão fazendo o melhor ao introduzir desde cedo seus bebês ao mundo virtual - no qual certamente um dia terão que participar - a cultura contemporânea facilita a introdução precoce às telas.

Quando voltamos nossa atenção para os SAICAS (Serviço de Acolhimento Institucional para Crianças e Adolescentes), onde uma equipe frequentemente reduzida precisa atender às necessidades de crianças e adolescentes de diversas idades, é comum observar a prática estabelecida de deixar os bebês em frente à televisão por períodos prolongados. Muitas vezes, esses bebês são colocados em seus carrinhos voltados para a TV, que pode estar sintonizada em um canal infantil ou em um programa especificamente voltado para bebês.

As telas são vistas não apenas como um auxílio para a equipe, mas como um estímulo positivo para o desenvolvimento infantil. Desta forma, além de uma facilidade, a televisão ocupa o lugar de um cuidador a mais da instituição, que proporciona companhia e estímulo a esses bebês.

Seja em um SAICA, no ambiente doméstico ou num espaço público, o resultado é uma ordem aparente, uma vez que as luzes e sons atraem e mantêm a atenção dos bebês que, retirados do convívio, deixam a sensação de um ambiente calmo e organizado.

Mas afinal, por que ordem aparente? Por que introdução precoce?

Qual o problema?

Desde o advento dos celulares smartphone e uso massivo da internet, apenas uma geração nasceu e cresceu. Ou seja, tivemos pouco tempo para entender os efeitos de um uso que, enquanto falamos, já está se transformando para adquirir novas formas e características. A intensidade crescente do uso de telas parece estar mobilizando esforços de pesquisa sobre exposição precoce mesmo no que tange a tecnologias mais antigas como a televisão (ver fontes bibliográficas ao final). O fato é que já sabemos um tanto e temos informação o suficiente para afirmar que as telas de forma geral podem ser extremamente prejudiciais para bebês e crianças pequenas.

Não à toa, a Organização Mundial da Saúde recomenda que bebês com menos de dois anos de vida não tenham nenhum tempo de exposição às telas. Após esse período inicial, as telas devem ser introduzidas de maneira limitada, progressiva e supervisionada durante toda a infância e adolescência. As demais instituições de saúde, em nível nacional e internacional, seguem na esteira das recomendações da OMS.

Ou seja, voltando aos bebês na frente da TV, é importante destacar que não existe programação verdadeiramente adequada para esta faixa etária.

Em uma pesquisa de 2015 (ver referências ao final) comparando crianças de 15 a 35 meses expostas frequentemente à TV com crianças não expostas ou com baixa exposição, verificou-se risco aumentado de atraso no desenvolvimento cognitivo, motor e da linguagem, proporcional ao tempo de exposição à televisão. Ou seja, quanto mais tempo na frente da TV, maior o risco. Uma outra pesquisa (2012) mostra que a televisão como pano de fundo, ligada no mesmo ambiente em que a criança está mesmo que esta não esteja prestando atenção, afeta negativamente o uso e aquisição da linguagem, a atenção, o desenvolvimento cognitivo e a função executiva - ou seja, a capacidade de processar informações e tomar decisões - em crianças com menos de cinco anos. Além dos impactos cognitivos, há impacto no desenvolvimento social: a exposição precoce reduz a quantidade e qualidade das interações entre pais e filhos - ou adultos cuidadores e crianças - e distrai a criança do brincar.

Uma outra pesquisa de 2022, que comparou grupos de crianças em idade pré-escolar com maior e menor tempo de exposição às telas, apontam diferenças significativas, com prejuízo para o primeiro grupo, no que diz respeito a problemas psicopatológicos, sobrepeso e obesidade, problemas do sono e distúrbios alimentares. A lista de males segue com cada nova pesquisa consultada: prejuízo no desempenho acadêmico, desenvolvimento social e emocional, depressão e ansiedade, prejuízo na capacidade de interpretar emoções, comportamento agressivo, redução na saúde física e no bem-estar geral.

Por que é tão problemático assim?

Como quase tudo na vida, as telas podem ter um uso positivo e um uso negativo. Isso se relaciona à qualidade do conteúdo consumido e também ao tempo de uso. Isso vale para crianças e para adultos também. Costumamos pensar que o cérebro se desenvolve na infância e depois para de se modificar. No entanto, ele segue se modificando ao longo de toda a vida.

Miguel Nicolelis, neurocientista brasileiro, alerta que as telas, particularmente os smartphones, podem alterar a fisiologia (função) e mesmo a morfologia (forma) do cérebro. O cérebro se molda às circunstâncias a que o indivíduo é exposto - é a chamada neuroplasticidade. Essa característica permite a criação bem como a perda de sinapses, em função do uso e desuso das mesmas. Nicolelis é contundente: as pesquisas atuais sugerem, e devem indicar cada vez mais, que os celulares estão moldando o nosso cérebro em prejuízo das funções da memória, criatividade, intuição e mesmo empatia. Isso vale para todos, inclusive adultos. O conceito da parentalidade distraída vem para mostrar que o uso excessivo de celulares incide também indiretamente sobre as crianças: como fica a relação quando os cuidadores estão ali só de corpo presente, imersos no virtual?

Por mais que o uso de telas tenha efeitos para todos, a infância é a época da neuroplasticidade por excelência. É quando o cérebro está, mais do que nunca, apto a adquirir novas vias de conexão e abandonar outras. Nesse período, há o que se chama de uma janela de oportunidade, ou seja, é ali que certas funções muito importantes, como a linguagem, devem se consolidar. A infância, particularmente a primeira infância, é quando se dá não só o desenvolvimento orgânico, cognitivo e motor das crianças, como também se estabelecem suas relações sociais e afetivas.

E é por isso que, no cruzamento entre os efeitos das telas sobre o cérebro humano e o período da vida onde esse mesmo cérebro está em pleno desenvolvimento, o cenário é um pouco mais complicado. E não há escapatória: quanto mais cedo a exposição, pior. E, mais uma vez, não há quantidade adequada de exposição a telas para bebês.

Julieta Jerusalinsky, psicanalista com extenso trabalho de prevenção em saúde mental na primeiríssima infância, fala que, dos 0 aos 3 anos de idade, temos um tempo de apropriação do corpo. O bebê descobrirá sua própria organização corporal, verá que no espelho o que está ali é ele mesmo e se dedicará a explorar as possibilidades de relações com o mundo: alcançar objetos, colocá-los na boca, se virar, engatinhar, andar, sorrir e receber sorrisos de volta, chamar e ser atendido, entrar em diálogos sonoros com seus cuidadores, perceber as sucessivas desregulações pelas quais seu corpo passa e aos poucos se apropriar delas, sejam fome, sono, frio, calor, frustração. Nesse cenário, a tela captura o bebê para fora de si mesmo e das relações com o outro, o corpo e o espaço.

Em alguns casos, vemos que os cuidadores confundem a captura que as telas produzem nos bebês com uma relação de prazer construtiva, dizendo-nos que "eles gostam" da TV ou do celular. Uma comparação pode ser elucidativa. Da mesma forma que alimentos industrializados são palatáveis, fáceis de serem gostados, telas e brinquedos eletrônicos tendem a ser preferidos pelas crianças quando estão disponíveis. Isso não significa que são mais saudáveis. Pelo contrário, os ultraprocessados empobrecem e mesmo "viciam" o paladar, visto que possuem aditivos que intensificam certos sabores naturalmente atraentes para a espécie humana. Os eletrônicos, por sua vez, expõem o cérebro a estímulos constantes, alterando as vias de recompensa do cérebro, empobrecendo as possibilidades de interação com o mundo. O uso de telas e brinquedos eletrônicos que "brincam por si mesmo" antagonizam a exploração e o brincar de qualidade para o bebê e a criança.

As alternativas

Portanto, é crucial promover uma reflexão coletiva e, quando o assunto são os SAICAs, implementar mudanças práticas no nível institucional. A primeira etapa é reavaliar a utilização das telas e conscientizar as equipes sobre seus efeitos no desenvolvimento dos bebês. É necessário realizar um amplo trabalho de formação e sensibilização para estabelecer diretrizes claras sobre o uso de telas dentro dos SAICAS e outras instituições que atendem à infância.

Algumas atitudes simples já podem exercer uma enorme mudança. Ao invés da TV, é possível, por exemplo, deixar os bebês dentro do chiqueirinho ou no chão com brinquedos à disposição. Em um momento em que estejam todos na sala, os bebês podem estar presentes sem necessariamente estarem expostos diretamente à TV. É possível acomodá-los de modo que possam observar as pessoas, deixando-os de costas para a TV. A TV pode também ser utilizada apenas para tocar alguma música para os bebês, enquanto esses estão nos seus carrinhos olhando para um outro ambiente e com objetos interessantes para explorar.

Enfim, o Governo Federal está desenvolvendo o "Guia para Uso Consciente de Telas por Crianças e Adolescentes", que deverá ser lançado até o final de 2024. Este guia tem o potencial de transformar as práticas institucionais e promover um ambiente mais saudável e adequado para o desenvolvimento das crianças e adolescentes.

Lembremos também que muito se fala sobre a importância de oferecer estímulos ao bebê. Mas de qual estímulo de fato se trata? Os estímulos positivos para o desenvolvimento envolvem participação ativa do bebê, ao contrário da relação de passividade, ou de recompensa imediata, que as telas promovem. Estimular o desenvolvimento cognitivo do bebê costuma ser muito mais simples do que as pessoas tendem a pensar. Elementos presentes na maioria das casas são necessários e suficientes, como por exemplo paninhos, colheres de madeira e de forma geral objetos que possam ser segurados pelo bebê e levados à boca. O bebê precisa também de tempo no chão, no qual possa testar seus apoios e descobrir como se relaciona com a gravidade e o que seu corpo pode fazer no espaço. Os objetos oferecidos ao bebê e criança pequena devem, em última instância, abrir caminho para o brincar, atividade central para o desenvolvimento.

Mais do que tudo, na infância, o estímulo mais importante é o social e afetivo. O tempo de qualidade com um adulto cuidador é a base sobre a qual tudo se estabelece. Estar perto de um adulto que se interesse pelo bebê, respeite seu tempo, celebre suas conquistas, compartilhe momentos de alegria, ofereça aconchego e dê apoio à exploração e aprendizagem naturais do bebê será fundamental para seu bom desenvolvimento.

Materiais de referência:

Intoxicações eletrônicas na primeira infância, entrevista com Julieta Jerusalinsky

Entrevista com Miguel Nicolelis, sobre o mundo digital e fisiologia e morfologia do cérebro

Movimento desconecta

Matéria do Hospital Einstein sobre o tema

Entrevista com Julieta Jerusalinsky

Guia para uso consciente de telas do governo federal

Perfil do pediatra Daniel Becker:

Dados brasileiros sobre infância e telas:
https://www.instagram.com/p/C7rgajKMrVg/

Qual a melhor tela quando preciso de um tempo para fazer minhas tarefas? https://www.instagram.com/p/C-TlDQLJS5Y/

4 sugestões para uma infância mais saudável na era digital: https://www.instagram.com/p/C9imYx8pdak/?img_index=1

Pesquisas:

https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/25544743/

https://ojs.unifor.br/RBPS/article/view/14054

https://bmcpublichealth.biomedcentral.com/articles/10.1186/s12889-022-12701-3

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC10353947/

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5823000/

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5823000/

https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/23027166/

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC8905397/

Fazendo História no Conselho Municipal dos Direitos da Juventude

Fazendo História no Conselho Municipal dos Direitos da Juventude

No próximo dia 25, acontecem as eleições para a gestão 2024/2026 do Conselho Municipal dos Direitos da Juventude, que discute, cria e executa políticas públicas para a juventude no município.

Representando o Instituto Fazendo História como uma entidade, a Bia e o Igor estão concorrendo a uma vaga no painel. Os dois são técnicos do Grupo nÓs.

Anna Beatriz da Silva Santos, candidata titular, é cientista social, formada pela UNIFESP. Atuante na rede de garantia de direitos da criança e do adolescente desde 2020 em serviços de acolhimento para crianças e adolescentes, é defensora dos direitos humanos, com foco em questões de gênero e sexualidade. Tem experiência profissional no ramo de projetos sociais de sustentabilidade, educação e música na cidade de São Paulo. 

Igor Gomes Xavier, candidato suplente, é formado em História pela USP, com cursos de extensão nas áreas de: história afro-brasileira, literatura periférica e direitos humanos. Poeta e articulador cultural, atua como arte educador em serviços da cultura e da assistência social. Já soma 8 anos de trabalho com juventudes.

As eleições acontecem dia 25/08 de forma híbrida, sendo possível votar online ou em 3 pontos presenciais da cidade de São Paulo. Todos os jovens residentes em São Paulo com idades compreendidas entre 15 e 29 anos podem votar. Para realizar a pré-inscrição, basta acessar https://forms.gle/6kdLxy9vF5ft9Wu69.

Os pontos de votação presencial são:
1. TEIA Cidade Tiradentes - R. Inácio Monteiro, 6900 - Conj. Hab. Sitio Conceição, São Paulo - SP, 08490-000

2. TEIA Interlagos - Av. Interlagos, 6122 - Interlagos, São Paulo - SP, 04777-000

3. Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania – R. Líbero Badaró, 199 – Sé, São Paulo - SP

Ampliar nossa participação nos conselhos e contribuir ativamente para a construção de políticas públicas voltadas para os jovens fortalece ainda mais o nosso compromisso ético, político e social com essa população.


OFICINA – Pega a visão: uso de drogas na adolesência

OFICINA – Pega a visão: uso de drogas na adolesência

No dia 29 de maio de 2024, o Instituto Fazendo História realizou a nona oficina presencial do Projeto Formação Profissional para o Trabalho com Jovens, com o apoio do FUMCAD (Fundo Municipal da Criança e do Adolescente), no Instituto Pólis. Com o tema "Pega a visão: uso de drogas na adolescência", o encontro foi direcionado aos profissionais que atuam nos Serviços de Acolhimento e também a outros atores da Rede Socioassistencial e do Sistema de Garantia de Direitos da Cidade de São Paulo. 

A oficina contou com a participação de Larissa de Aragão Pires, terapeuta ocupacional pela USP, pós-graduada em Saúde Mental pela UNIFESP e mestranda em Ensino em Ciências da Saúde da UNIFESP.

Larissa inicia o encontro abordando como o tema das drogas, ou substâncias psicoativas, ainda se apresenta como um tabu em nossa sociedade, ao mesmo tempo que acontece de forma corriqueira no cotidiano das pessoas, atravessando as experiências pessoais de cada uma. Ela expõe um histórico do uso de drogas na humanidade, compreendendo-as como substâncias que agem sobre o cérebro e alteram o estado de percepção e consciência, fazendo parte das mais diversas culturas e tendo diferentes usos e significados. Traz, a partir de um panorama mundial, as grandes questões relacionadas ao uso de drogas, como o tráfico, o aumento da população carcerária e o debate da descriminalização da maconha, temáticas que precisam ser olhadas a partir de um recorte de classe e de raça.

A convidada também apresenta os principais modos de enxergar o uso de drogas hoje na sociedade. Um deles é a abordagem proibicionista, na qual o discurso é centrado na ideia do não uso, evitando-se inclusive falar sobre o tema, associando-o a um problema de segurança pública, a abstinência como único cuidado possível e a uma valorização do saber técnico-científico. A segunda perspectiva é a de redução de danos, a qual parte do princípio que a pessoa tem conhecimento sobre si mesma e que se processa por meio da construção coletiva de saberes, onde o plano terapêutico é desenvolvido em conjunto com o sujeito. Nesta, o foco está nas pessoas e não no uso da substância, fazendo-se necessário compreender cada uma em sua integralidade para encontrar a forma de olhar e lidar com a questão, e prevendo a garantia de direitos básicos e a valorização da diversidade. 

Em seguida, Larissa expõe algumas das substâncias mais conhecidas, problematizando o uso de álcool, legalizado, como o principal causador de mortes e enfatizando o K9, usado com muita frequência pelos adolescentes atualmente e ainda com poucos estudos sobre seus impactos. Aponta, não só o álcool e a maconha, mas também o vape, fenômeno social ligado à adolescência, como as principais substâncias utilizadas pelos jovens em situação de acolhimento institucional nos dias de hoje. Indica como cada uma delas tem uma forma específica de agir no sistema nervoso central, variando em seus efeitos frente a cada corpo e a cada contexto, e os perigos no uso misturado de diferentes substâncias. 

Ela também aborda quais são os sinais de alerta que demonstram que alguém necessita de primeiros socorros imediatos e quais são os casos que precisam de algum tipo de ajuda - quando entendemos o uso de drogas como uma questão de saúde, e não apenas de segurança pública. Apresenta, então, quais são os serviços referências nesse cuidado e orientação da população, sendo eles: Centro de Atenção Psicossocial Infanto-Juvenil (CAPS IJ); Centro de Atenção Psicossocial de álcool e drogas (CAPS AD), para pessoas acima de 18 anos; e a Unidade Básica de Saúde (UBS).

Em uma segunda parte do encontro, Larissa abre para perguntas e reflexões trazidas pelos participantes, debatendo com eles acerca de alternativas em territórios que não têm CAPS, quais são as principais tecnologias disponíveis e que podem ser acessadas, assim como seus impasses e precarizações, quais são as premissas da redução de danos e em que espaços podem ser desenvolvidas, e quais caminhos podem ser pensados, alternativos à política pública da violência hoje em vigor. Ela também cita diversas publicações disponíveis no site do É de lei, organização referência no cuidado e na redução de danos, para ampliar o conhecimento e a discussão sobre as mais diferentes drogas.

No momento final da oficina, cada participante é convidado a registrar uma cena envolvendo o uso de drogas, presente em seu cotidiano de trabalho, que o inquietou, machucou ou desafiou, e depois compartilhar em pequenos grupos. Depois disso, cada grupo escolheu duas dessas cenas para analisar de forma mais aprofundada e apresentar ao grupo maior, com a mediação de Larissa. Dentre os elementos a serem considerados estavam: quem são os sujeitos da cena, o local em que ela se dá, os paradigmas e projetos de mundo observados, os tensionamentos e necessidades evidenciadas, os facilitadores e barreiras presentes e verbos de destaque. Essa foi uma parte muito rica do encontro, proporcionando troca de desafios, angústias e possibilidades, e indicando como, ao falar sobre situações de uso de drogas, mais do que abordar as substâncias e suas especificidades, estamos falando de garantia de direitos, e de como eles vêm sendo violados sistematicamente.

Larissa de Aragão Pires é terapeuta ocupacional pela USP, pós-graduada em Saúde Mental pela UNIFESP e mestranda em Ensino em Ciências da Saúde da UNIFESP. Também atua como redutora de danos infanto-juvenil há 7 anos com pessoas que apresentam sofrimento psíquico decorrente do uso de substâncias psicoativas.

Confira o vídeo com a oficina completa: clique aqui.

Serviços de acolhimento contemplados pelo projeto “Fazendo Minha História em Sergipe e Alagoas” na cidade de Aracaju e região metropolitana.

Serviços de acolhimento contemplados pelo projeto “Fazendo Minha História em Sergipe e Alagoas” na cidade de Aracaju e região metropolitana.

É com muita alegria que divulgamos a lista de serviços de acolhimento contemplados no projeto “Fazendo Minha História em Sergipe e Alagoas” na cidade de Aracaju e região metropolitana.

1. Unidade de Acolhimento Sorriso

2. Unidade de Acolhimento Caçula Barreto

3. Casa Lar 1 

4. Casa Lar 2 

5. Casa Lar 3

6. Casa da Criança Nossa Senhora Da Vitória

7. Unidade de Acolhimento Mista Irmã Valmira


Com o apoio do Ministério da Cultura, construiremos junto a cada um dos novos parceiros um espaço de leitura com 300 livros infantojuvenis. O projeto ainda conta com seminários formativos para os profissionais e todo o suporte necessário para favorecer o desenvolvimento integral de crianças e adolescentes acolhidos.

Parabéns aos selecionados, estamos muito felizes por fazer história com vocês! 


OFICINA – Adolescências e Histórias de Vida

OFICINA – Adolescências e Histórias de Vida

No dia 27 de março de 2024, o Instituto Fazendo História realizou a oitava oficina presencial do Projeto Formação Profissional para o Trabalho com Jovens, com o apoio do FUMCAD (Fundo Municipal da Criança e do Adolescente), no Instituto Pólis. Com o tema "ADOLESCÊNCIAS E HISTÓRIAS DE VIDA: QUANDO A HISTÓRIA COMEÇA A SER CONTADA? ". O encontro foi direcionado aos profissionais da Rede Socioassistencial e do Sistema de Garantia de Direitos da Cidade de São Paulo. 

Para esse encontro, convidamos Anita Machado: Psicanalista em formação com graduação em Psicologia pela PUC- PR (2002) e formação em terapia familiar e de casal pelo Intercef - PR (2004). A convidada decide iniciar a oficina aquecendo os convidados com uma dinâmica na qual, a partir do simples ato de olhar, poderíamos nos comunicar e nos colocar no lugar do outro. Essa atividade faz uma associação com uma experiência humana fundamental: a capacidade de imaginar como seria estar na pele do outro, levando em consideração todas as suas experiências, características sociais, biológicas e culturais. Essa reflexão nos ajuda a compreender melhor as histórias de vida de cada indivíduo

Anita pediu aos profissionais convidados que trouxessem um objeto considerado importante para eles, a fim de compartilhar suas histórias pessoais e explicar o significado que esse objeto possui para cada um. A partir da dinâmica, os participantes da oficina puderam compartilhar com o público um pouco de suas memórias. Durante esse momento, foi feita uma exposição sobre o trabalho da psicóloga Ecléa Bosi, que se dedica ao estudo da memória. Ecléa Bosi destaca a importância das narrativas pessoais e das histórias de vida na preservação e transmissão da memória, enfatizando como essas histórias são fundamentais para a reconstrução e interpretação das experiências vividas.

Dando continuidade à oficina, Anita propôs um espaço para os trabalhadores da rede socioassistencial refletirem. Nesse sentido, ela apresentou quatro perguntas importantes para o trabalho com histórias de vida. Anita dividiu os profissionais em quatro grupos, sendo cada grupo responsável por refletir sobre uma dessas questões.

1. O trabalho com adolescentes é difícil? Por que?

2.No trabalho com adolescentes há uma história que se repete? Qual?

3.No trabalho com adolescentes qual é a experiência mais marcante?

4.Quem são os adolescentes que vocês trabalham?


Após a reflexão em grupo, Anita sugere que cada grupo eleja uma palavra forte que representa o cerne das discussões realizadas. Essa prática permite compartilhar com o grupo maior um resumo significativo do processo de reflexão e das conclusões alcançadas por cada equipe.

Ao final do encontro, Anita conduz um momento mais expositivo sobre a adolescência. Ela aborda alguns marcadores importantes, como o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), destacando o início e o fim desse período segundo critérios cronológicos. No entanto, ela também relaciona esses marcos com as diretrizes da Organização Mundial da Saúde (OMS), que introduz a noção de pré-adolescência, evidenciando que, embora existam definições baseadas em idade, as experiências sociais podem variar consideravelmente. Isso significa que certos eventos podem ocorrer em momentos considerados precoces de acordo com os marcadores cronológicos, mas que refletem as complexidades das experiências individuais e sociais durante essa fase.

Anita destaca que as histórias de vida dos adolescentes ganham vida quando são narradas, mas também enfatiza a importância de os profissionais as acolherem. Ela ressalta que o objetivo não é simplesmente descobrir as pessoas, mas sim criar oportunidades narrativas para que elas se reinventem, "caminhando para si" através das longas estradas dos relatos de vida. No estudo "Oficinas de história de vida: uma construção metodológica no enlace entre psicanálise e saúde coletiva" — apontado por Anita durante a oficina — as narrativas das histórias de vida compartilhadas pelas adolescentes foram destacadas. O estudo sublinhou os deslocamentos na leitura que essas jovens faziam do processo em que estavam inseridas. O objetivo era colaborar com a produção de rupturas da posição de vítima, desconstruindo certezas e verdades cristalizadas e admitindo a dispersão onde se supunha unidade e identidade.

“lembrar não é reviver, mas refazer, reconstruir, repensar, com imagens e ideias de hoje, as experiências do passado. A memória não é sonho, é trabalho” (BOSI, 1994)

Autoria: Vinícius Mas - Técnico do programa Formação no Instituto Fazendo História, psicólogo e especialista em Saúde Mental pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Dedica grande parte dos seus esforços atuando com pessoas em situação de risco.

Anita Machado é Psicanalista em formação com graduação em Psicologia pela PUC- PR (2002) e formação em terapia familiar e de casal pelo Intercef - PR (2004). Mestre em Psicologia Escolar e Desenvolvimento Humano pela IP-USP (2012). Supervisora clínico institucional de equipes da Assistência Social e da Saúde. Atende em consultório particular crianças, adolescentes, adultos e casal, para conduzir esta oficina.

 1. (Conte, M., Silveira, M., Torossian, S. D., & Minayo, M. C. S., 2014).

Confira o vídeo com a oficina completa: clique aqui 

DIVULGAÇÃO CRIANÇA ESPERANÇA 2024 - Programa Fazendo Minha História estabelece parceria com cinco serviços de acolhimento institucional

DIVULGAÇÃO CRIANÇA ESPERANÇA 2024 - Programa Fazendo Minha História estabelece parceria com cinco serviços de acolhimento institucional

Com o financiamento do Criança Esperança, o Programa Fazendo Minha História estabelece parceria com cinco serviços de acolhimento institucional nos municípios de Francisco Morato, Franco da Rocha, Cajamar e Mairiporã.

Acreditando no potencial e na transformação por meio da literatura no contexto de acolhimento, é com alegria que divulgamos os 5 serviços de acolhimento contemplados pelo projeto " Bibliotecas Vivas: Memórias que Educam".

Associação Sítio Agar - SAICA II (Cajamar)

Abrigo Municipal Abrindo Caminhos - ABRICAM (Mairiporã)

Associação Sítio Agar - SAICA I (Francisco Morato)

Associação Sítio Agar - SAICA II (Francisco Morato)

Projeto Ensignar - Franco da Rocha


Construiremos junto com cada um dos serviços de acolhimento parceiros um espaço de leitura com 200 livros infantojuvenis. O projeto também prevê seminários para profissionais dos serviços de acolhimento, formação de voluntários e palestra para rede de Educação e todo o suporte necessário para os serviços no que diz respeito ao trabalho com histórias de vida, por meio da literatura, visando o desenvolvimento integral de crianças e adolescentes acolhidos.

Parabéns aos selecionados, estamos muito felizes por FAZER HISTÓRIA com vocês!

Equipe Fazendo Minha História.

OFICINA – Saúde Mental e Juventude

OFICINA – Saúde Mental e Juventude

No dia 28 de fevereiro de 2024, o Instituto Fazendo História realizou a sétima oficina presencial do Projeto Formação Profissional para o Trabalho com Jovens, com o apoio do FUMCAD (Fundo Municipal da Criança e do Adolescente), no Instituto Pólis. Com o tema "Saúde mental e juventude", o encontro foi direcionado aos profissionais que atuam nos Serviços de Acolhimento e também a outros atores da Rede Socioassistencial e do Sistema de Garantia de Direitos da Cidade de São Paulo. 

A oficina contou com a participação de Kwame Yonatan, psicanalista e doutor pela PUC-SP, atua como supervisor, é professor no Instituto Gerar, poeta e escritor. O convidado inicia propondo um exercício de apresentação, onde cada participante, além de trazer seu nome e organização na qual trabalha, indica como se define racialmente. Ele aponta como isso permite um diagnóstico de como estamos situados no mundo e que fazer essa pergunta às crianças e jovens é, na verdade, questionar: como me vejo, como sou visto e como quero ser visto. Além disso, contar nossa história e nos nomearmos é um exercício de saúde mental, e poder se dizer racialmente contribui para o rompimento de silenciamentos, que ocorrem quando não falamos e prevalece o que dizem sobre nós. 

Em seguida, o convidado aborda o objetivo a ser percorrido ao longo da oficina: ampliar o conceito de saúde mental, se afastando de um reducionismo por uma via hegemônica, onde prevalece o olhar para diagnósticos, e trazendo o escopo da singularidade, da multiplicidade e da pluralidade, para então, entrelaça-lo ao campo da juventude. Nesse momento, provoca o grupo a pensar sobre o que é saúde mental, apresentando alguns conceitos, de onde partem e suas problematizações. Ele aproxima a ideia de saúde ao acesso à vida, como algo gradativo, relacional e coletivo: saúde mental se vincula às relações que estabelecemos, aos momentos de nossa existência que afetam a saúde, de modo que um sujeito em sofrimento psíquico também pode ter sua existência reduzida. 

Para abranger como esse conceito aparece na prática, Kwame apresenta dados e reflexões da história do campo da saúde mental no Brasil, indicando suas raízes na psiquiatria e traçando alguns elementos importantes nesse caminho, como o surgimento dos primeiros hospitais psiquiátricos e das primeiras leis assistenciais e higienistas, iniciativas pioneiras nas formas de enxergar e atuar com a ideia da loucura e a instauração da lei da reforma psiquiátrica, em 2001, visando retirar a loucura de uma perspectiva punitivista para um lugar do cuidado. Ele discute como, apesar da lei, a lógica manicomial ainda está presente hoje, em muitos espaços, precisando ser reconhecida e combatida. Aponta, também, em 2002, a portaria que estabelece o que são os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), propondo outra lógica de cuidado no território e um processo de desinstitucionalização da loucura, a partir da articulação em rede.

O convidado segue discutindo como é essencial olhar para as disputas históricas para se compreender a constituição do campo da saúde mental no Brasil, considerando a ideia de raça como crucial nesse percurso. Ao problematizar quais corpos eram, em sua maioria, dos internados em manicômios, aborda como essa construção foi forjada em um processo de desumanização de negros e indígenas. Kwame indica, então, como, ao falarmos de saúde mental, para muito além da ideia de diagnósticos, precisamos levar em conta as histórias dos sujeitos e as violências pelas quais estes passaram, cuidando para não reduzir questões de outros campos relacionais a um aspecto individual. Provoca a pensar como, muitas vezes, é por meio do sofrimento psíquico que os jovens expressam as violências pelas quais passam, indicando uma perspectiva de olhar o sintoma na qual se reconhece que ele vem acompanhado de uma história e de uma narrativa.

Kwame ainda propõe uma discussão sobre juventude, pautada no Guia de Referência ao Enfrentamento à Violência e ao Racismo contra Jovens Negros. Ele expõe como, ao falarmos de jovens no Brasil, precisamos nos perguntar de que jovens estamos falando, considerando diferentes marcadores sociais, como de raça, gênero, classe e orientação sexual. Quanto mais marcadores tiver esse jovem, maior a sua exposição às vulnerabilidades e mais ele pode expressar essas violências que, muitas vezes, não são ouvidas e aparecem em forma de diagnósticos. Traz também como a ideia de juventude está atrelada a um lugar de questionamento à ordem estabelecida e que, por conta dessa capacidade, há sempre o perigo dessa força política ser silenciada e patologizada. Torna-se urgente pensar em quais são os espaços que estamos abrindo para a escuta dos jovens e como escutar, de fato, o que está sendo contestado, em direção à humanização desses sujeitos, repletos de desejos e sonhos.

Em um segundo momento do encontro, como forma de dialogar com os profissionais presentes, Kwame lança as perguntas disparadoras: como veem o que é escuta qualificada e o que seria essa qualificação da escuta? A partir das contribuições, ele indica como ela se vincula às ideias de exercício de alteridade, de processo e de aprendizagem e que, por vezes, quando o jovem chega ao serviço, essas três dimensões são esquecidas e ele se torna um diagnóstico. Aponta como fundamental o movimento de os profissionais se abrirem para olhar para esses sujeitos, com outras histórias, perspectivas e raças, e para como esses determinantes sociais os afetam. Trata-se de um exercício de escutar para além do que está sendo dito, cuidando para não impor as próprias visões de mundo e, assim, reproduzir violências. Por fim, aborda como a qualificação da escuta deve caminhar como um processo de humanização desses jovens, deixando-se afetar, abrangendo sua história e garantindo direitos.

Autoria: Maytê Aché Saad - Técnica do programa Formação no Instituto Fazendo História, psicóloga e mestre em Educação e Saúde na Infância e na Adolescência pela UNIFESP. Atua como psicóloga clínica e com processos de supervisão e formação de equipes na área da educação e assistência social.

Kwame Yonatan é psicanalista e doutor pela PUC-SP, professor no Instituto Gerar, poeta e escritor. Tem também experiência profissional em políticas públicas, sendo supervisor institucional de profissionais do SUS e do SUAS e compõe o coletivo Margens Clínicas, grupo de psicanalistas e psicólogas que atuam no enfrentamento à violência de Estado. Também é um dos articuladores do projeto "Aquilombamento nas Margens". 

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OFICINA – Estratégias e Reflexões sobre o Projeto Político Pedagógico

OFICINA – Estratégias e Reflexões sobre o Projeto Político Pedagógico

No dia 31 de janeiro de 2023, o Instituto Fazendo História realizou a sexta oficina presencial do Projeto Formação Profissional para o Trabalho com Jovens, com o apoio do FUMCAD (Fundo Municipal da Criança e do Adolescente), no Instituto Pólis. Com o tema "ESTRATÉGIAS E REFLEXÕES SOBRE O PPP". O encontro foi direcionado aos profissionais da Rede Socioassistencial e do Sistema de Garantia de Direitos da Cidade de São Paulo. 

Para esse encontro, convidamos Valéria Pássaro, pedagoga e especialista em educação e acolhimento, para conduzir esta oficina. A palestrante compartilhou sua experiência na construção do PPP no serviço em que trabalhou por muitos anos, abordando os desafios, conquistas, preocupações e algumas das estratégias que ela implementou. Ela inicia sua abordagem com uma observação crítica sobre o papel do pedagogo nos serviços de acolhimento. Ela destaca que a elaboração do Projeto Político Pedagógico (PPP) não é uma responsabilidade exclusiva desses profissionais, fazendo um alerta: "Não solicitem aos pedagogos que resolvam os problemas dos projetos políticos pedagógicos das instituições".

Valéria ressalta a inadequação de simplesmente copiar e colar o PPP, já que ele está intrinsecamente ligado à realidade específica de cada serviço de acolhimento. Ela argumenta que uma instituição com diversos serviços não pode criar um PPP genérico que sirva para todos os espaços, enfatizando a necessidade de que cada serviço tenha o seu próprio PPP. Isso se deve à singularidade de cada grupo, composto por profissionais ou acolhidos com diferentes vivências. Valéria destaca a importância de ouvir todas as partes envolvidas e exemplifica, questionando se, por exemplo, o PPP prevê um trabalho com a família que, para a especialista, é fundamental. 

A palestrante enfatizou que a construção do PPP deve ser realizada no serviço e por aqueles que ali estão e destacou a importância de valorizar as vivências das crianças e adolescentes acolhidos, tanto na elaboração quanto na garantia do seu desenvolvimento.

Confira o vídeo com a oficina completa: clique aqui.

Valéria Pássaro é pedagoga e especialista em educação e acolhimento. Com uma vasta experiência, ela atuou como coordenadora na Casa das Expedições e atualmente desempenha o papel de diretora executiva na Moradia Associação Civil. Ao longo de mais de 30 anos dedicados à área de acolhimento institucional, esteve na vanguarda das mudanças, não apenas nas legislações pertinentes, mas também nas propostas de acolhimento e em como essas transformações impactam os diversos equipamentos.

OFICINA – O Trabalho em Rede: Construindo estratégias a partir do Território

OFICINA – O Trabalho em Rede: Construindo estratégias a partir do Território

No dia 24 de janeiro de 2024, o Instituto Fazendo História realizou a quarta oficina presencial do Projeto Capacitação em Serviços de Acolhimento, com o apoio do FUMCAD (Fundo Municipal da Criança e do Adolescente), no Instituto Pólis. Com o tema "O trabalho em rede: construindo estratégias a partir do território", o encontro foi direcionado aos profissionais que atuam nos Serviços de Acolhimento e também a outros atores da Rede Socioassistencial e do Sistema de Garantia de Direitos da Cidade de São Paulo. 

A oficina contou com a participação de Rafael Sá Martins, educador social, graduado em história, especialista em Juventude no Mundo Contemporâneo. E Thamara Sauini, cientista ambiental, mestre e doutora em biologia química. 

Thamara apresenta uma definição de território, enquanto espaço formado por meio de ações realizadas por determinados atores que levam à sua apropriação, e convida o grupo a refletir sobre as formas nas quais estão inseridos nos territórios que moram e trabalham. Ao usar exemplos de marcos em São Paulo, contextualizando como eram antigamente e o que se tornaram a partir de pressões urbanas, ela indica como o território está estritamente vinculado com as noções de enraizamento, identidade, lugar de vida e relações cotidianas. 

Ao apresentar a ideia de cidade como um sistema vivo que absorve experiências, Thamara traz o que seria uma educação socioambiental, despertando os participantes para uma nova forma de pensar e olhar para o território. Ela aponta como isso envolve um diagnóstico de que território é esse, de suas dinâmicas e interações, compreendendo o espaço enquanto um sistema integrado com a natureza, onde se compartilha recursos com ela, e não acima dela. Cita, também, a noção de trilhas urbanas, como espaços pedagógicos que possibilitam uma “quebra” nas rotinas escolares, partindo do reconhecimento de diferentes elementos, serviços ambientais e usos que podemos fazer dos espaços e áreas verdes no entorno. 

Ainda se utilizando de imagens com diferentes paisagens, a convidada segue instigando os participantes a identificarem os elementos presentes para além do que se enxerga, a refletirem sobre a ação do homem em relação à natureza e os diversos usos e relações possíveis com os territórios a partir de diferentes culturas e tempos históricos. Por fim, ela propõe uma atividade prática, de produção de desenhos sobre o lugar onde trabalham e dos elementos que lembram dessa região, incluindo aquilo que enxergam e não enxergam, o que sentem, o que conhecem e não conhecem, sua vegetação, fauna, flora e aspectos sociais e econômicos. Essa atividade proporcionou uma troca muito rica no grupo e novas possibilidades de olhar para esses territórios e de fazer articulações com seus recursos.

Em um segundo momento, Rafael assume a fala, questionando ao grupo quais são os diferentes serviços presentes na oficina e em que regiões se encontram. Ele indica como pensar o trabalho em rede a partir da perspectiva do território faz com que a abordagem se torne diferente da usual, na qual prevalece a ideia de que a rede não funciona. Assim, partindo de suas experiências, o convidado traz reflexões sobre diferentes tipos de redes existentes, puxadas por serviços diversos, formais e informais, e com recortes temáticos. E, se aproximando do foco do público do encontro, apresenta um conceito de rede como um conjunto de ações, programas, serviços, projetos públicos e privados que atuam de forma integrada, garantindo os direitos das crianças e dos adolescentes.

Em seguida, Rafael convida o grupo a ampliar a definição de território como espaço físico e social onde crianças e adolescentes vivem e interagem, trazendo algumas provocações: como que o território influencia no processo de desenvolvimento dessas crianças e adolescentes?

Como possibilitamos às crianças e adolescentes estarem em seus territórios, potencializando quem são e podem ser?

Ele convoca a pensar sobre elementos, ausências e presenças, espaços e políticas públicas, a partir da perspectiva das crianças e do adolescentes que têm um papel significativo em seu cotidiano.

O encontro finaliza com uma breve exposição de ferramentas que podem fortalecer o reconhecimento e apropriação dos profissionais em relação ao território em que estão inseridos, visando potencializar o trabalho com as crianças, adolescentes e suas famílias.

Confira o vídeo com a oficina completa: clique aqui.

Rafael Sá Martins é educador social, graduado em história, especialista em Juventude no Mundo Contemporâneo e Gestão e Planejamento de Processos Pastorais e Pedagógicos, e assessor da Tocando em Frente Assessorias, acompanhando o trabalho de organizações sociais que atuam com crianças e adolescentes na cidade de São Paulo.

Thamara Sauini é cientista ambiental, mestre e doutora em biologia química pela UNIFESP, técnica em turismo, e desde 2018, atua como educadora no Instituto Trilhas pesquisando áreas verdes, monitorando trilhas interpretativas e elaborando materiais educativos. 

OFICINA – O Trabalho com Famílias de Adolescentes em Acolhimento

OFICINA – O Trabalho com Famílias de Adolescentes em Acolhimento

No dia 29 de novembro de 2023, o Instituto Fazendo História realizou a quinta oficina presencial do Projeto Formação Profissional para o Trabalho com Jovens, com o apoio do FUMCAD (Fundo Municipal da Criança e do Adolescente), no Instituto Pólis. Com o tema "O trabalho com famílias de adolescentes em acolhimento". O encontro foi direcionado aos profissionais que atuam nos Serviços de Acolhimento e também a outros atores da Rede Socioassistencial e do Sistema de Garantia de Direitos da Cidade de São Paulo. 

A oficina contou com a participação de Milena Maciel, psicóloga, mestre e doutora em psicologia. Milena inicia o encontro convidando as participantes a indicarem palavras que, para elas, definem o que é família. Partindo dessas ideias, que remetem a um lugar de cuidado e proteção e às próprias referências e vivências do grupo, ela provoca a pensar como, nem sempre, as famílias que convivemos e atuamos vão corresponder a esses elementos. A convidada aborda as várias formas de família que existem e as diversas relações que acontecem no contexto familiar, para além de um modelo padrão que ainda prevalece em muitos discursos. 

No primeiro momento do encontro, Milena promove uma reflexão sobre como a família se torna a nossa primeira noção de comunidade, onde iremos construir nossa história de vida e somos também construídos. Ela cita o Estatuto da Criança e adolescente (ECA) para ampliar o conceito, incluindo a família extensa, para além da nuclear, e outras figuras de referência com quem se tem vínculos de afinidade e afetividade. A partir da experiência de construção de uma árvore genealógica da família e também da apresentação de dados do Censo (IBGE), a convidada discute como a ideia de família na sociedade foi se transformando ao longo do tempo e das gerações, em termos de grau de escolaridade e educação, lugares ocupados por homens e mulheres e tamanho das famílias, por exemplo.

Milena aborda o termo “família desestruturada”, o qual circula hoje em muitos espaços e vem normalmente atrelado às famílias em situação de vulnerabilidade social e de pobreza, como forma de questioná-lo dentro do Sistema de Garantia de Direitos, considerando que a falta de estrutura não pode ser direcionada às famílias, mas sim a um sistema social que não oferece, enquanto políticas públicas, o suporte para que elas se mantenham. Diferentes modelos possíveis de famílias são apresentados, indicando como essas composições convivem no cotidiano e precisam ser reconhecidas no trabalho desenvolvido pelos Serviços de Acolhimento. 

Ainda nesse primeiro momento, Milena traz para discussão uma definição de adolescência, enquanto fase de transição da infância para a vida adulta e que, assim como a família, é uma construção social que se transforma a cada tempo histórico e contexto cultural. Aborda também como é um período caracterizado por muitas mudanças físicas e psicossociais e que há diversas formas de viver a adolescência, marcada pelas experiências que se pode ter acesso. Aqui, ela se utiliza da apresentação de dados de uma pesquisa com adolescentes brasileiros para refletir como eles próprios entendem a relação com as famílias hoje, atravessada por espaços de afeto e de escuta, mas que também pode ser lugar de violências e de violação de direitos.

Ao apontar a noção de vínculo como um laço que se constitui nas trocas, nos afetos e no cotidiano, Milena afirma como função do Serviço de Acolhimento ser um espaço de desenvolvimento para adolescentes, de reconstrução e fortalecimento de vínculos e de possibilidades de novas experiências. Ela indica alguns papéis que precisam ser assumidos nesse espaço, como de identificar e conviver com a diferença e com as múltiplas formas de famílias, e de partir daquilo que elas mostram como realidade para entender suas potencialidades, fazendo uma nova provocação: como podemos trabalhar com uma família, nas novas histórias que ela pode construir, se já partimos da ideia de que ela é incapaz? 

Em um segundo momento da oficina, a convidada propõe o compartilhamento de experiências desafiadoras vivenciadas com famílias de adolescentes pelos serviços, a partir de um exercício em que, primeiro, registrou-se essas situações e, depois, trocou-se os papéis entre os grupos para se pensar estratégias possíveis para lidar com as questões. 

Antes de encerrar, Milena ainda apresenta alguns pontos importantes de serem considerados no planejamento de propostas junto às famílias pelos Serviços de Acolhimento envolvendo, por exemplo, como esses espaços se preparam para escutar, recebê-las e o trabalho de ouvir o adolescente sobre suas vinculações e afetos para pensar junto com ele possibilidades de reinserção. Também compartilha algumas ações e recursos para se desenvolver com as famílias, enfatizando a potência do trabalho em grupo que possibilite espaços coletivos de aproximação e reflexão.

Confira o vídeo com a oficina completa: clique aqui

Milena Maciel é psicóloga, mestre e doutora em psicologia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Ela é também professora de Psicologia do Desenvolvimento Humano e coordena grupos de preparação para adoção e para apadrinhamento afetivo.

OFICINA – Sexualidade na Adolescência: Escutas Urgentes

OFICINA – Sexualidade na Adolescência: Escutas Urgentes

No dia 04 de outubro de 2023, o Instituto Fazendo História realizou a quarta oficina presencial do Projeto Formação Profissional para o Trabalho com Jovens, com o apoio do FUMCAD (Fundo Municipal da Criança e do Adolescente), no Instituto Pólis. Com o tema “Sexualidade na adolescência: escutas urgentes”, o encontro foi direcionado aos profissionais que atuam nos Serviços de Acolhimento e também a outros atores da Rede Socioassistencial e do Sistema de Garantia de Direitos da Cidade de São Paulo.

A oficina contou com a participação de Dandara Gal dos Santos, mulher travesti, negra, gorda, da periferia da Zona Leste de São Paulo, psicóloga clínica, sexóloga e militante. Ela iniciou sua atuação na psicologia no terceiro setor com crianças e adolescentes em vulnerabilidade e hoje trabalha na clínica, especialmente com mulheres, pessoas pretas, gordas e lgbtqiap+, sob as óticas da psicologia decolonial e da terapia analítica junguiana.

Dandara inicia se apresentando e colocando a responsabilidade que é abordar essa temática com os profissionais dos serviços de acolhimento. Ela adianta que fará uma fala provocativa, já que acredita que dificilmente se produz transformação social sem incômodos e sem o questionamento dos sistemas que estão estabelecidos e, ao mesmo tempo, acolhedora, visando a troca e a construção de conhecimentos conjuntos. Em seguida, propõe uma divertida dinâmica de telefone sem fio, estimulando a reflexão na qual, mesmo perto e cochichando no ouvido, esbarramos com dificuldades em, de fato, escutar o outro.

Na primeira parte do encontro, a convidada faz uma proposta de definição de adolescência, como um período de transição entre a infância e a vida adulta, de intensas modificações hormonais, biológicas, psicológicas e sociais e quando, convencionalmente, aflora-se a questão da sexualidade. Ela indica também uma concepção de sexualidade, ao abordá-la como um aspecto central do ser humano e que abrange não só o ato sexual em si, mas também as identidades, os papéis de gênero, a orientação sexual, o erotismo, o prazer, a intimidade e a reprodução. Traz como ela se expressa em nossos pensamentos, desejos, valores, comportamentos e relacionamentos e, para ser compreendida de forma mais singularizada, precisa-se considerar a ideia de interseccionalidade: trata-se da relação entre diferentes características sociais, como gênero, raça e classe, que define que lugares que determinadas identidades podem ocupar socialmente e a quais violências estão submetidas.

A partir da convocação do grupo com perguntas, da exposição de narrativas e de dados de pesquisas e, também, de um exercício no qual todos foram convidados a refletir sobre as suas experiências sexuais, Dandara propõe que olhem para as particularidades da sexualidade na adolescência, especialmente, em situação de acolhimento, quais suas características e diferenças em relação a outras adolescências. Ela reforça, como uma dessas especificidades, o contexto de vulnerabilidades e de muitas rupturas que marcam o processo de desenvolvimento desses adolescentes, onde já foram privados de direitos fundamentais. E abre para a discussão de aspectos, tais quais, a reprodução de discursos machistas e misóginos sobre sexualidade em nossa sociedade, enquadrando homens e mulheres em papéis esperados; o perigo da ideia na qual adolescentes não têm sexualidade, gerando vergonha e dificultando o acesso a informações e espaços de cuidado e prevenção; e a dimensão da responsabilidade dos profissionais acerca daquilo que é dito, partindo de uma escuta que considere o lugar de quem fala e contribuindo com outros caminhos e discursos possíveis, que promovam mais consciência aos adolescentes em relação aos seus próprios corpos.

Em um segundo momento, como forma de sensibilizar para a importância de espaços de escuta quando falamos da sexualidade de adolescentes, Dandara parte de um exercício individual no qual convida os participantes a tocarem e sentirem uma parte do corpo, o que, de modo geral, se perde dentro de um cotidiano atribulado e tomado por cobranças. Aborda a ideia na qual torna-se difícil ouvir o outro, se não nos percebemos antes, acerca de quem somos e o que estamos fazendo em nossas vidas.

Nessa parte da oficina, Dandara levanta algumas questões para os participantes e complementa com dados de seus estudos e conhecimentos. A primeira delas é sobre o problema do silenciamento da sexualidade dos adolescentes, onde se discute a sexualidade como forma primordial de expressão e de estar no mundo, permeando as conversas, afetos e escolhas das pessoas. E como silenciar é contribuir para uma vulnerabilização ainda maior desses adolescentes, gerando impactos, como a quebra de direitos sexuais e reprodutivos, prejuízos na construção da identidade e da autonomia, a busca por fontes de informação ineficientes e deturpadas, que reforçam estereótipos de gênero, maior exposição à violência sexual e uma tendência à repressão da sexualidade do outro.

A convidada também dialoga sobre porque é tão difícil falar sobre sexualidade com os adolescentes, indicando um não-lugar que eles ocupam na sociedade, cheio de conflitos, e que confronta o adulto a encarar sua própria adolescência e a sua relação com a sexualidade, ao trabalhar com eles. Aborda a relevância de se considerar as estruturas de poder postas, como o patriarcado e o capitalismo, a partir de uma perspectiva colonial, moralista e cheia de tabus, que funda nossa sociedade e determina e controla o que é visto como certo e errado, incluindo o que diz respeito às questões de sexualidade e de gênero.

Dandara finaliza apresentando os benefícios de práticas de escuta e da educação sexual com os adolescentes, assim como indicando caminhos possíveis nesse trabalho. Nesse sentido, ela aponta para a importância de superar as concepções morais e religiosas que podem fazer parte da formação do profissional e olhar da perspectiva dos adolescentes, do que faz ou não sentido a eles, e da promoção de espaços de diálogo e escuta, sem imposição. Precisa-se reconhecer que falar de sexualidade é falar também de corpo, interesses, legitimação de desejos, de sonhar outros futuros e, principalmente, de prazer, para que este possa ser vivido de forma saudável e não violenta. Acredita que tudo isso pode contribuir para o desenvolvimento de adolescentes e adultos mais responsáveis consigo e com o outro, fortalecidos em suas identidades e autoestima, conscientes de seus próprios corpos, desejos, limites e da importância do autocuidado, rompendo, inclusive, com ciclos de violência.

Confira o vídeo com a oficina completa: clique aqui.

OFICINA – Acompanhamento de Grupo de Irmãos no Acolhimento

OFICINA – Acompanhamento de Grupo de Irmãos no Acolhimento

No dia 18 de outubro de 2023, o Instituto Fazendo História promoveu a terceira oficina presencial do Projeto Capacitação em Serviços de Acolhimento, apoiado pelo FUMCAD (Fundo Municipal da Criança e do Adolescente), no Instituto Pólis. O evento teve como foco 'Acompanhamento de grupo de irmãos no acolhimento' e foi direcionado a profissionais dos Serviços de Acolhimento, além de outros atores da Rede Socioassistencial e do Sistema de Garantia de Direitos da Cidade de São Paulo.

Os palestrantes foram Deise Fernandes do Nascimento, mestra e doutora em Educação e Saúde na Infância e Adolescência pela UNIFESP e fundadora e coordenadora Geral do Coletivo Círculo de Cultura; e Alan de Loiola Alves, doutor em Serviço Social pela PUC-RJ e PUC-SP, e especialista no Atendimento a Crianças e adolescentes vítimas de Violência Doméstica.

Para sensibilizar os convidados sobre a temática do encontro, os palestrantes realizaram uma dinâmica em que os participantes responderam o que veio à mente quando se pensa em irmãos. Ao explorarem diversas palavras associadas aos laços familiares fornecidas pelos participantes, eles estimularam a reflexão sobre os aspectos positivos, como laços afetivos e confiança, mas também sobre os desafios inerentes, como conflitos e inveja entre irmãos. Enfatizaram que ao lidar com grupos de irmãos no acolhimento, apesar das diferentes histórias, tratamos de relações próximas onde essas questões cruciais estão em jogo, incluindo a ambivalência entre o desejo de proximidade e o distanciamento entre eles

Alan inicia sua fala explorando a proteção como ponto central do debate. Ele introduz o sistema de garantia de direitos de crianças e adolescentes, destacando sua origem, os instrumentos normativos que o sustentam e sua relação com as políticas públicas. Em seguida, questiona a lógica tutelar, convidando o grupo a refletir sobre as consequências da separação de irmãos e a importância de considerar os desejos das crianças e adolescentes quanto ao convívio familiar e comunitário.

Além disso, enfatiza a necessidade de os profissionais dos serviços de acolhimento reconhecerem e articularem políticas que visem fortalecer os vínculos familiares, questionando a prática de acolhimento motivada pela pobreza, o que contraria o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Ele ressalta o direito desses jovens de serem criados em ambientes com vínculos, salientando o papel dos atores do Sistema de Proteção e de Garantia de Direitos em preservar esses laços desde a chegada até o desligamento do serviço.

Alan destaca a presença dos irmãos como fonte de apoio e referência para as crianças e adolescentes em acolhimento, facilitando o enfrentamento desta condição, ressaltando a importância de reconhecer os laços afetivos existentes, mesmo diante de conflitos. Ele destaca a individualidade de cada jovem, sem perder de vista a importância dos laços e do convívio familiar. Estar com os irmãos é poder viver a convivência familiar no serviço. Separar, em contrapartida, como se faz historicamente, é negar esse direito.

Deise, por sua vez, inicia com o poema “Verbo ser”, de Carlos Drummond de Andrade, estimulando a reflexão na qual, muitas vezes, ignoramos o que a criança sente, deseja e o que ela já é, ao criar narrativas de que ela só vai ser no futuro. Ela questiona falas que naturalizam e determinam que irmãos que brigam e têm conflito não se gostam e não poderão se dar bem, apontando como, no decorrer do processo de desenvolvimento, muitas pessoas podem passar e contribuir com o fortalecimento de vínculos, sendo o serviço de acolhimento um espaço fundamental nesse sentido. A convidada, ao reconstruir com o grupo as principais ações feitas pelos serviços para preservação dos vínculos familiares e comunitários, indica como é papel deles identificar e reforçar os vínculos e afetos presentes nessas relações.

Durante sua fala, Deise destaca a necessidade de pensar estrategicamente ações que promovam relações de companheirismo entre irmãos. Ela aponta a importância de não sobrecarregar os irmãos mais velhos, evitar comparações e estimular o diálogo e atividades compartilhadas para manter a convivência familiar no serviço de acolhimento. Aborda também que é necessário enxergar essas relações a partir das histórias singulares que se apresentam, sem se deixar pautar pelos próprios relacionamentos pessoais e experiências com os irmãos por parte da equipe. 

No segundo momento da oficina, Deise e Alan apresentam uma pesquisa feita com crianças e adolescentes que viveram o acolhimento junto aos seus irmãos, baseada nas falas deles sobre essas relações. Eles incentivam o compartilhamento de experiências e perguntas dos participantes sobre esse tema, abrindo espaço para um diálogo enriquecedor.

Confira o vídeo com a oficina completa: 

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Deise Fernandes do Nascimento é assistente social, mestra e doutora em Educação e Saúde na Infância e Adolescência pela UNIFESP, fundadora e coordenadora Geral do Coletivo Círculo de Cultura.

Alan de Loiola Alves é mestre e doutor em Serviço Social pela PUC-RJ e PUC-SP, especialista no Atendimento a Crianças e adolescentes vítimas de Violência Doméstica e pesquisador do Núcleo de Estudos e Pesquisa sobre Criança e Adolescente - ênfase no Sistema de Garantia de Direitos (NCA-SGD) – Programa de Pós Graduação em Serviço Social - PUC/SP.

OFICINA –  Cuidando de quem cuida: saúde mental dos trabalhadores do serviço de acolhimento

OFICINA – Cuidando de quem cuida: saúde mental dos trabalhadores do serviço de acolhimento

No mês de dezembro, o Instituto Fazendo História, em parceria com o Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONDECA), realizou a oficina "Cuidando de quem cuida: saúde mental dos trabalhadores do Serviço de Acolhimento" nas cidades de Guarulhos e Campinas. Participaram as profissionais Ana Carolina Barros Silva, psicóloga e psicanalista, com doutorado em Psicologia, Linguagem e Educação pela Universidade de São Paulo e pela Université Paris VIII - Vincennes (França); e Luciana Braga, psicóloga, psicanalista e mestre em educação.

A oficina teve início com a introdução das profissionais. Ana apresentou a proposta de trabalho que realiza na "Casa de Marias" e a centralidade no atendimento a mulheres negras e periféricas, que, frequentemente, não recebem cuidados na mesma medida em que cuidam. Em seguida, foram apresentados dados estatísticos sobre causas de adoecimento no contexto de trabalho.

Os dados mostraram que o recorte de gênero e raça são fatores importantes a serem considerados. De acordo com a prática clínica, as mulheres adoecem mais que os homens (principalmente em relação à depressão), o que não exclui a possibilidade dos homens também serem afetados por tais questões, embora muitas vezes não consigam sinalizar ou verbalizar isso devido ao sistema patriarcal em que estamos inseridos.

No momento de interação, foram distribuídas folhas, lápis e canetas aos participantes, propondo que refletissem se já haviam adoecido alguma vez por conta do trabalho, e que eles escrevessem sobre suas experiências. Após a atividade, foram apresentados os impactos da Necropolítica nas Políticas de Assistência Social e de Saúde Pública no contexto brasileiro, incluindo desvalorização salarial e formas de acesso e cuidado que contribuem para o adoecimento dos trabalhadores.

Para encerrar o primeiro bloco da oficina, Ana e Luciana dividiram os participantes em grupos por sorteio, com o objetivo de realizar um Diagnóstico Institucional - identificando problemas estruturais que os grupos avaliam como geradores de impacto negativo no bem-estar físico e mental da equipe de colaboradores das instituições onde atuam.

O segundo bloco da oficina foi conduzido pela profissional Luciana, que baseou sua apresentação em saberes decoloniais, incluindo a Filosofia Ubuntu, conhecimento de nossa história como um movimento de ancestralização das relações, utilizado há séculos, e hoje considerado inovador.

Com base nas propostas de bem viver e no conceito de Ubuntu apresentados, os grupos reuniram-se novamente para pensar e planejar coletivamente ações que poderiam ser implementadas nas instituições onde atuam, com o intuito de iniciar ou ampliar políticas de bem-estar para as equipes de colaboradores.

A oficina foi finalizada com uma grande roda de conversa entre todos os participantes, onde os grupos puderam compartilhar as discussões realizadas.

Ana Carolina Barros Silva, psicóloga, psicanalista com doutoramento em Psicologia, Linguagem e Educação pela Universidade de São Paulo e pela Université Paris VIII - Vincennes(França), pesquisadora e consultora em saúde mental da população negra, coordenadora- geral da Casa de Marias.

Luciana Braga, psicóloga,psicanalista,e mestre em educação, atua há cerca de 20 anos na clínica com crianças e adolescentes e na formação de profissionais da educação e do acolhimento psicossocial, com foco em uma perspectiva feminista e decolonial.

Assista à oficina na íntegra: clique aqui.

OFICINA–   O Racismo no contexto do Acolhimento

OFICINA– O Racismo no contexto do Acolhimento

No mês de novembro de 2023, o Instituto Fazendo História, em parceria com o Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONDECA) – SP, realizou a oficina: “O Racismo no contexto do Acolhimento" nas cidades de Guarulhos e Campinas. Foram convidadas as profissionais Maria Ribeiro, cientista social e doutora em Comunicação e Semiótica, pela PUC e Universidade de Paris, e Carla França Ferreira Rosa, psicóloga com atuação na área clínica e social e especialista em Saúde da Família. 

Maria Ribeiro deu início à apresentação com o conceito de marcadores sociais da diferença, convidando os presentes a refletir sobre o racismo a partir da perspectiva do nascimento das pessoas negras. Em seguida, falou sobre grupos de pessoas cêntricas; a figura do homem branco cisgênero; sistema de opressão da branquitude; racismo fenotípico; pessoas não brancas e a maneira como a sociedade contemporânea se organiza a fim de manter o sistema de privilégios.

A partir da apresentação de cenas com as quais se deparou em seus processos pessoais e de pesquisa, fez marcações importantes do que considerar ao abordar a questão racial, indicando que devemos considerar a partir da gestação. Ressalta ainda a importância do registro de informações do quesito de raça/cor para pensar as políticas públicas e especificidades da população negra. Aborda também o conceito de humanização no processo de cuidado, a categoria mãe na relação com a qual a nossa sociedade se organiza, e apresenta a lógica comunitária de estar no mundo como uma tecnologia de sobrevivência.

Na sequência, Carla dá início a sua fala, provocando os profissionais a repensar sobre suas práticas de trabalho cotidianas. Apresenta o contexto sócio-histórico, no qual aborda o papel do educador social no trabalho com criança e adolescente e sua família, e faz a marcação da importância dos profissionais se perceberem no processo, a partir do reconhecimento de si antes de olhar para o outro. Conceitos de branquitude e racismo institucional também foram discutidos, para indicar a importância de reconhecer que não somos iguais e que é a partir disso que podemos atuar de modo mais assertivo. 

No segundo momento, o grupo foi sensibilizado por meio de vídeos e convidados a compartilhar suas práticas de trabalho relativas à questão racial. A partir da partilha coletiva, as profissionais retomam alguns conceitos trazidos inicialmente e aprofundam as questões, a fim de auxiliar nas reflexões e construção. de conhecimento. 

O encontro acaba com o reconhecimento da importância de falar sobre o racismo no contexto de trabalho, uma vez que é algo estrutural e atravessa todos nós, bem como a necessidade de se pensar práticas de enfrentamento.

“Já que não podemos fazer o gesto de voltar diante do útero das pessoas que nos gestaram, nós podemos experimentar o renascimento, toda vez que estendemos nossa escuta em direção ao outro [...] a fim de garantir que crianças e adolescentes tenham recursos para fazer o enfrentamento a essas violências” 

Maria Ribeiro, 2023.

Assista à oficina na íntegra: https://youtu.be/2XQjMhOZC6w

Maria Ribeiro é cientista social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), mestre (PUC-SP) e doutora (PUC-SP/Paris-Diderot) em Comunicação e Semiótica. Professora no Programa de Pós-Graduação em Humanidades, Direitos e Outras Legitimidades (FFLCH/USP), e na Coordenadoria Geral de Especialização, Aperfeiçoamento e Extensão (COGEAE/PUC-SP). Redatora-geral do Simpósio Internacional de Assistência ao Parto (SIAPARTO), do grupo executivo da Rede Brasileira de Mulheres Cientistas (RBMC) e do Conselho do Núcleo de Estudos das Diversidades, Intolerâncias e Conflitos (Diversitas/FFLCH-USP) e  analista de formação do Instituto Amma Psique e Negritude. 

Seu relatório de estágio pós-doutoral (FFLCH-USP), intitulado "Ginecológicas: o nascimento negro para além da tragédia", foi contemplado pelo Programa de Ação Cultural do Estado de São Paulo (ProAC), na categoria “ensaio de não-ficção” e publicado em 2023.

Carla França Ferreira Rosa é psicóloga com mais de 10 anos de vivência na área clínica e social. Especialista em Saúde da Família e educadora social com ampla experiência em formações para profissionais de equipamentos sociais e instituições de ensino, (Instituto Fazendo História, Marista Escola Social, Colégio São Luís, Instituto Tomie Ohtake, EMESP Tom Jobim, Fundação Escola de Sociologia e Política de SP, SENAC Santo André entre outros). 

Desde 2022, atua como co-coordenadora de Grupos de Reflexão do Curso Teórico-Vivencial: Psicologia e Relações Raciais no Instituto Amma Psique e Negritude. É integrante da "Odô Consultoria Viva".

 

OFICINA –  Adoção – Reflexões Sobre as Práticas de Trabalho

OFICINA – Adoção – Reflexões Sobre as Práticas de Trabalho

No mês de outubro de 2023, o Instituto Fazendo História, em parceria com o Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONDECA) – SP, realizou a oficina: “Adoção - Reflexões Sobre as Práticas de Trabalho” nas cidades de Guarulhos e Campinas. Participaram como convidadas as profissionais Ana Clara Fusaro Silva Rodrigues, especialista em psicoterapia psicanalítica pelo CEPSI e mestre em Ciências pelo Departamento de Psicologia Clínica da Universidade de São Paulo (USP); e Larissa Alves, adotiva, co-fundadora da Associação Brasileira de Pessoas Adotadas e do Adotivas Podcast.

Ana Clara deu início ao encontro apresentando sua experiência na graduação com grupos de pretendentes à adoção na cidade de Uberaba – MG, encaminhados através da Vara da Infância e Juventude após habilitados e, posteriormente, na cidade de São Paulo, em seu projeto de mestrado na USP. Enfatizou a adoção sob o ponto de vista psíquico onde, no momento em que ocorre a adoção, cria-se uma relação entre família de origem, família adotiva e a criança. É o momento em que as histórias se atravessam, mesmo que as famílias não se conheçam e nunca tiveram nenhum tipo de contato. Sendo assim, todo o histórico da criança ou adolescente incluindo os motivos do acolhimento e destituição do poder familiar, não devem ser desconsiderados ou ignorados pelos pretendentes a adoção, afirmou a profissional.

Outros pontos mencionados por Ana Clara são os dados de pessoas habilitadas atualmente: a maioria (cerca de metade) reside na região Sudeste do país e são famílias compostas por casais heterossexuais (casados ou sob união estável). Além disso, muitos desses casais buscaram a adoção por não conseguirem ter filhos biológicos, com histórico de frustrações e perdas, enfrentando ainda a resistência por parte de seus familiares quando tomam esta decisão. Em seguida, faz a reflexão de que o fato de famílias e pessoas estarem habilitadas para adoção não significa que estão prontos. Finalizou sua fala frisando a importância do cuidado nos processos de transições, sendo que as equipes de serviços de acolhimento tem o papel fundamental na transmissão de conhecimentos sobre a criança/adolescente (história, rotina, gostos, registros, saúde).

Larissa deu seguimento à oficina falando sobre a falta de referenciais sobre o que é ser adotivo, um exemplo disso é que só existe uma associação de adotivos no país. Em relação ao trabalho com famílias adotivas, mencionou a importância do acompanhamento efetivo nos pós adoção por parte do judiciário, a importância da preservação das origens e histórias de vida de adotivos e a falta de amparo legal que encontram ao tentar buscá-las. Além disso, ressaltou a falta de acompanhamento nas adoções compartilhadas em que algumas partes não cumprem o acordo, rompendo de forma drástica o vínculo entre irmãos e provocou a reflexão: de que forma podemos proporcionar o reencontro entre eles sem o amparo da lei?

A profissional enfatizou que os efeitos a longo prazo dos rompimentos de vínculos que os adotivos passam ao longo da vida não são considerados pela maioria dos profissionais que atuam nos serviços de garantia de direitos. As crianças ou adolescentes sempre precisam se adaptar à vida dos pretendentes e questões importantes como raça, cultura, linguística, entre outros devem ser considerados.

Larissa finalizou sua fala com a reflexão do quanto é indispensável a desconstrução da romanização e senso comum sobre adoção. Para isso, é necessário que os adotivos tenham espaço e visibilidade para falarem sobre o assunto e que os pretendentes sejam de fato preparados e acompanhados para esse processo, sem a intenção de que um(a) filho(a) virá para atender suas expectativas.



Ana Clara Fusaro Silva Rodrigues é psicóloga pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM), especialista em psicoterapia psicanalítica pelo CEPSI e mestre em Ciências pelo Departamento de Psicologia Clínica da Universidade de São Paulo (USP).

Larissa Alves é adotiva, jornalista, bacharel em direito, produtora audiovisual, co-fundadora da Associação Brasileira de Pessoas Adotadas e do Adotivas Podcast, escreve sobre perspectiva adotiva no @olharadotivo no Instagram, é produtora do canal Adotados no Youtube e pesquisa sobre emoções e direitos adotivos.

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OFICINA – Os Limites Do Educador no Trabalho com Adolescentes

OFICINA – Os Limites Do Educador no Trabalho com Adolescentes

No dia 19 de setembro de 2023, o Instituto Fazendo História realizou a quarta oficina presencial do Projeto Formação Profissional para o Trabalho com Jovens, com o apoio do FUMCAD (Fundo Municipal da Criança e do Adolescente), no Instituto Pólis. Sob o título "Os Limites do Educador no Trabalho com Adolescentes", o encontro foi direcionado aos profissionais que atuam nos Serviços de Acolhimento e outros atores da Rede Socioassistencial e do Sistema de Garantia de Direitos da Cidade de São Paulo. O convidado José Nildo Alves Cardoso, um advogado, professor, assessor parlamentar, teólogo e especialista em Direito das Crianças e Adolescentes, conduziu uma jornada de reflexão profunda sobre os desafios e responsabilidades do trabalho com adolescentes vulneráveis.

O encontro começou com saudações e agradecimentos, seguidos pela apresentação de José Nildo, que compartilhou sua vasta experiência e envolvimento no campo da educação social. A plateia foi convidada a expressar suas expectativas e preocupações para o dia. Zé destacou que ser educador social não é apenas um emprego, mas uma filosofia de vida. Educar é um compromisso que transcende o horário de trabalho e exige intencionalidade na promoção da transformação social e da liberdade dos educandos.

A oficina abordou a necessidade de reconhecer o adultocentrismo e tratar os adolescentes como indivíduos em peculiar desenvolvimento. A ênfase foi dada à importância de criar um ambiente de aprendizado que desperte a curiosidade e o encantamento pelo saber.

A discussão se concentrou em definir o que são limites, quem os estabelece nas relações humanas, e como os educadores sociais devem ter autoridade sem serem autoritários. O conceito de ética profissional foi abordado, incluindo questões éticas e dilemas que os educadores sociais podem enfrentar ao definir limites adequados.

José Nildo também explorou a transferência (quando os adolescentes projetam emoções nos educadores) e a contratransferência (reações emocionais dos educadores) e como lidar com esses processos.

Foi lembrado a importância do autocuidado, que influencia diretamente o trabalho com adolescentes. Sinais de esgotamento e burnout foram discutidos, bem como a busca por apoio quando necessário.

A Oficina incluiu casos para estimular discussões sobre desafios éticos e práticos enfrentados pelos educadores sociais. O encerramento envolveu a abertura para perguntas, discussões e compartilhamento de experiências entre os participantes.

José Nildo convidou os educadores a compartilhar um compromisso pessoal sobre como aplicar as estratégias discutidas em seu trabalho. O encontro foi uma oportunidade única para reflexão e aprendizado, deixando a todos com insights valiosos sobre os limites do educador ao trabalhar com adolescentes.

Confira o vídeo com a oficina completa: clique aqui.